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Crítica: “The Last of Us” – 2ª Temporada (2025)

  • Foto do escritor: Igor Biagioni Rodrigues
    Igor Biagioni Rodrigues
  • 3 de jun.
  • 6 min de leitura

A vingança nunca é plena, mata a alma e a envenena…

Por Igor Biagioni Rodrigues.

The Last of Us
The Last of Us- HBO/Divulgação

Histórias de vingança são um dos tropos narrativos mais comuns, não só no audiovisual, mas também em diversas outras mídias. Então, o que diferencia uma boa obra com essa temática de uma medíocre ou até ruim? Todo o resto que a envolve: seus personagens e suas reflexões. E nisso, se o material de origem já se destacava, a segunda temporada da adaptação do jogo homônimo o explora em novos níveis. Porém, embora a temporada construa debates e espelhamentos de personagens bastante interessantes, de formas que não estavam presentes no jogo, ela também adapta partes desnecessárias de seu material de origem, que não possuem função narrativa dentro da linguagem audiovisual. Mas vamos analisar as coisas por partes.


A segunda temporada de "The Last of Us" retoma a narrativa cinco anos após os acontecimentos devastadores da primeira. Joel e Ellie agora vivem em Jackson, Wyoming, uma comunidade cercada por muros e por uma frágil sensação de paz. Mas os fantasmas do passado, especialmente a verdade sobre o que ocorreu no hospital dos Vagalumes, começam a assombrar e corroer a relação entre os dois. Quando uma tragédia atinge o coração da comunidade, Ellie parte em uma jornada implacável por vingança. Em meio a um mundo brutal, ela enfrentará não apenas inimigos humanos e infectados, mas também o peso de suas escolhas, mergulhando em uma espiral de violência, dor e transformação.


Como dito na crítica do episódio piloto da primeira temporada, "The Last of Us" não é sobre zumbis e apocalipse; esses são apenas pano de fundo para a verdadeira temática da série: as relações e os sentimentos humanos. Se a primeira temporada retrata a construção de um laço familiar entre Joel e Ellie, encerrando-se de forma trágica e ambígua ao mostrar até onde se pode ir por amor, a segunda temporada retrata justamente as consequências dessas ações feitas em nome de um bom sentimento, mas que geram outros sentimentos ruins, criando uma espiral de ódio e vingança que só pode terminar em tragédia.


Virou meio que moda na internet criticar a construção da personagem atacando a atriz Bella Ramsey, seja por sua aparência, seja por sua interpretação. Sobre a aparência da atriz, nem vale comentar: é nojento e covarde utilizar isso como argumento. Já em relação à atuação de Ramsey, vou contra a maré. Sua atuação não é ruim, pelo contrário, a atriz trabalha muito bem com o roteiro que lhe foi entregue. Muitos acreditam que uma boa atuação é necessariamente expressiva, em que o ator transborda sentimentos no rosto. Mas não: há também a atuação contida, aquela em que o ator permite ao espectador sentir e compreender o que o personagem está vivenciando sem precisar escancarar emoções; e é aí que está o ouro da atuação, algo que Bella entrega com maestria. O problema é que a temporada opta por focar exclusivamente na jornada de Ellie, exigindo da personagem alternâncias frequentes entre ternura e raiva. Talvez por isso ocorra certa estranheza — mas essa é uma questão de escolha narrativa, e não uma falha de Ramsey como atriz. Aliás, todo o elenco principal é bastante eficaz, seja Isabella Merced com sua sarcástica Dina, ou Pedro Pascal, que em suas poucas aparições continua excelente.


The Last of Us
Pedro Pascal e Bella Ramsey em The Last of Us- HBO/Divulgação

Quanto à adaptação, como mencionado anteriormente, a série inclui partes desnecessárias do jogo, especialmente nos momentos “exploratórios” que levam os personagens do ponto A ao ponto B (geograficamente falando). Dentro de um jogo de videogame, faz sentido explorar todos os ambientes em uma jornada é parte fundamental da mídia. Mas no audiovisual, mostrar todos os obstáculos que Ellie enfrenta pelos cenários escalando, pulando, navegando, sendo capturada pelos Serafistas etc. acaba criando apenas elipses narrativas que servem para inflar a duração dos episódios.


Voltando à questão das decisões narrativas, acredito que muitos dos problemas poderiam ter sido resolvidos caso tivessem optado por intercalar a jornada de Ellie com a de Abby. Ao mostrar toda a trajetória de Ellie e finalizar com aquele cliffhanger, a série joga um balde de água fria no espectador. No jogo, a mudança abrupta de controle quando o jogador para de jogar com Ellie e passa a jogar com Abby cria um choque, mas tudo acontece de uma vez só. Ao decidir separar isso por temporadas, o sentimento construído se dilui com o intervalo de tempo real necessário até o desfecho. Teria sido mais assertivo intercalar ao longo desta temporada os arcos das duas personagens, alternando entre elas sempre que um arco chegasse a um clímax. No entanto, compreendo que, por motivos comerciais, dividir a história em duas temporadas era mais interessante financeiramente, fazendo com que esta funcione como uma temporada de transição. E, nesse aspecto, ela cumpre bem seu papel. Se a terceira temporada tiver um bom desfecho, muita gente que não gostou desta segunda temporada talvez nem se importe mais. Se nesta temporada optaram por desconstruir a imagem de heroína da Ellie, colocando-a não como vilã, mas como antagonista, talvez façam o mesmo com Abby, desconstruindo sua imagem de vilã e a reposicionando também como antagonista. Assim, ambas estariam em pé de igualdade, sem certo ou errado absolutos.


Agora, aos pontos positivos. Nesta temporada, somos apresentados à vida em Jackson. Aliás, um dos maiores acertos da temporada é justamente a forma como Jackson é retratada; seu dia a dia, funcionamento, e a construção de uma comunidade de fato. Isso confere maior peso às atitudes egoístas de Ellie, ao mostrar o que ela está disposta a deixar para trás em sua busca por vingança.


The Last of Us Abby e Joel
Cena da segunda temporada de The Last of Us-HBO/Divulgação

Outro aspecto que vale ser destacado é que, apesar de certas decisões narrativas que critiquei, a temporada apresenta uma coesão narrativa muito interessante, com cenas que, num primeiro momento, parecem jogadas, mas que depois revelam seu propósito ao funcionarem como espelhamentos das atitudes de Ellie. Por exemplo: no quinto episódio, vemos Isaac torturar um Serafita e, ao final do mesmo episódio, Ellie tortura Nora. Se, por um lado, Ellie demonstra compaixão por Dina, que está grávida, em sua busca por vingança ela mata Nora, que também estava grávida. Além disso, os espaços onde essas cenas acontecem são muito bem pensados. Grande parte das interações importantes entre Dina e Ellie, e entre Ellie e Jesse, ocorrem em um teatro. No camarim, local onde os atores se transformam em seus personagens ou revelam quem são de verdade. Ellie conta toda a verdade para Dina, mostrando sua verdadeira face (guardadas as devidas proporções, Ellie faz com Dina o mesmo que Joel fez com ela). Já no palco, espaço da encenação, onde os personagens se apresentam ao público, Ellie e Jesse têm uma conversa extremamente pessoal. E, por fim, é no aquário que Ellie se afoga de vez nessa missão autoimposta de falsa justiça.


É na relação entre os personagens que reside o ouro da série. Por isso, episódios como o quarto, em que vemos a conexão entre Ellie e Dina finalmente acontecer,e o sexto, que retrata a ascensão e queda do relacionamento entre Joel e Ellie, se destacam tanto. Mas seria injusto dizer que a qualidade se resume apenas ao texto e às atuações. A produção da série é digna de cinema: desde os momentos bem construídos de terror até toda a parte técnica: maquiagem, coreografias, cenários, fotografia, toda a mise-en-scène do excelente segundo episódio comprova isso.


Em suma, a segunda temporada de "The Last of Us" pode decepcionar um pouco por servir como uma temporada de transição, mas ainda assim se mostra uma excelente adaptação, com ótimas atuações, cenas marcantes de terror e ação, e, acima de tudo, por continuar fazendo o que sabe fazer de melhor: construir e debater relações humanas. Tudo isso com uma mensagem clara: nossas ações têm consequências, e esse ciclo egoísta de violência nunca terá fim.


Para quem só se importa com números:

Nota- 7/10.


Ficha Técnica:

Título Original: The Last of Us

País de Origem: Estados Unidos

Criação: Craig Mazin e Neil Druckmann (baseado no jogo de videogame de mesmo nome desenvolvido pela Naughty Dog)

Roteiro: Craig Mazin e Neil Druckmann

Direção: Mark Mylod, Nina Lopez-Corrado, Stephen Williams e Kate Herron.

Classificação: 16 anos.

Duração: 7 episódios de aproximadamente 50 minutos


Elenco:

Bella Ramsey como Ellie Williams

Pedro Pascal como Joel Miller

Kaitlyn Dever como Abby

Isabela Merced como Dina

Young Mazino como Jesse

Gabriel Luna como Tommy Miller

Jeffrey Wright como Isaac

Danny Ramirez como Manny

Ariela Barer como Mel

Tati Gabrielle como Nora

Spencer Lord como Owen

Rutina Wesley como Maria Miller

Robert John Burke como James

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