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Teologia e o gênero da superaventura

  • Foto do escritor: Iuri Biagioni Rodrigues
    Iuri Biagioni Rodrigues
  • 5 de ago.
  • 4 min de leitura

Vamos conhecer a proximidade entre a Teologia e as histórias dos super-heróis!

Por: Iuri Biagioni Rodrigues

Super-heróis

Você já parou para pensar na relação entre as histórias dos super-heróis e a Teologia? Neste texto, vamos conhecer um pouco mais sobre essa imbricação. Para isso, utilizei a obra "O Alienígena e o Menino", fruto da tese de doutorado "A Superaventura: da narratividade e sua expressividade à sua potencialidade teológica", do professor, pesquisador e meu xará Iuri Andréas Reblin.


O Alienígena e o menino
Capa do livro lançado pela Paco Editorial - Obs: caso não tenha percebido, o alienígena é o Superman e o menino é o Capitão Marvel (Shazam)

Sobre essa relação entre religião e quadrinhos de superaventura, Iuri Reblin aponta que a proximidade entre a Teologia e os quadrinhos de super-heróis pode ser analisada em três perspectivas: temática, metodológica e ideológica.


A aproximação temática ocorre porque toda história da superaventura aborda temas relevantes para a teologia, como o bem, a morte, a justiça e a esperança. Toda narrativa desse gênero é, de um modo geral, é uma história de salvação. A diferença está no fato que a superaventura tem os super-heróis como sujeitos da ação e a Teologia tem Deus, Jesus ou outra divindade nesse papel, dependendo da religião.


Além do mais, tanto as histórias de super-heróis quanto a Teologia abordam a questão do mal e como ele interfere no cotidiano. Nas HQs, geralmente, o mal e a violência são representados como externos à humanidade ou localizados em personagens e grupos específicos. Assim, o mal é representado nos supervilões ou em catástrofes. O foco da atitude dos heróis está no combate aos inimigos e na superação do desastre.


Outro detalhe interessante é que os vilões mais perigosos e poderosos são, comumente, alienígenas que querem conquistar ou destruir a Terra, indicando a ideia que o mal é exterior à humanidade. Essa ideia também pode ser observada em vilões que apresentam psicopatologias, já que a maldade não é algo natural deles e sim uma consequência desses problemas. Já para a Teologia, o mal é o chamado para o pecado e pode prover de qualquer pessoa. Outrossim, para a Teologia, notadamente, a protestante, todos os seres humanos são capazes de fazer maldades.


A proximidade temática também é notada no relacionamento e no compromisso estabelecido entre o super-herói e a humanidade. Isso gera motivação para a atuação do herói. Na teologia, Deus é comprometido com a humanidade e se relaciona com ela, porque é o criador de todas as coisas e ama sua criação, por isso se compromete com ela. Agora, nas histórias em quadrinhos, cada herói possui uma resposta para esse comprometimento.


Por exemplo, Homem-Aranha segue o princípio de que “com grandes poderes vêm grandes responsabilidades”. Batman torna-se herói por causa da trágica morte de seus pais e trabalha para impedir que a criminalidade afete a vida das pessoas da maneira que afetou a sua. Thor recebe uma lição de humildade ganhando um alter ego mortal, aprendendo o valor da humanidade e entendendo seu papel como deus, dedica-se a proteger toda e qualquer forma de vida nos Nove Reinos. Já o Superman, é um alienígena superpoderoso que quis ser e viver como um humano. Assim, além de nivelar-se à condição humana, ele compartilha seus dons, poderes, conhecimento e preocupa-se com todas as formas de vida, servindo de exemplo e símbolo de esperança para as pessoas.


A aproximação metodológica diz respeito à maneira em que os temas são apresentados. Aqui, existe uma “proximidade ritualística”. A experiência teológica e religiosa é um ritual, uma recordação de uma história de salvação que é remodelada para um novo contexto. Narra-se uma ação extraordinária em prol da humanidade que é histórica, mas que continua na atualidade, ou seja, o discurso religioso é atualizado em cada época. Como narrativa mítica, a superaventura, também funciona desta maneira. Suas histórias sempre seguem a seguinte fórmula: aparece uma ameaça, surge um herói, acontece uma luta pelo destino do mundo e/ou das pessoas, ocorrem derrotas e vitórias parciais e, no fim, o herói salva o dia. Ao ser recontada, essa narrativa recebe o acréscimo de elementos atuais como pessoas, fatos, acontecimentos, lugares e temas.


Deste modo, quadrinhos de heróis produzidos durante a Guerra Fria dialogavam diretamente com o contexto daquela época. Da mesma forma, os quadrinhos atuais, representam aspectos da contemporaneidade. Para Iuri Reblin, contudo, os mesmos conflitos, angústias, medos, inseguranças e valores, ainda que com modificações e adaptações, frequentemente aparecem nas tramas. Nas palavras do pesquisador: “Há uma tensão constante entre história e atualidade” (Reblin, 2015,p.236), e isso é válido tanto para teologia quanto para as revistas de heróis.


Por último, a aproximação ideológica refere-se à intencionalidade existente na teologia e na superaventura, provavelmente, mais na teologia, principalmente na vertente conhecida como Teologia da Libertação conforme explica Reblin. Citando Durkheim, ele explica que teologia e superaventura são manifestações da necessidade humana de “conceber o ideal e de acrescentá-lo ao real”. Apesar disso, a superaventura busca uma salvação momentânea e a teologia aspira uma salvação eterna. Assim, não se trata da extinção de desastres e violências, mas sim da instalação de uma nova ordem social onde não haja sofrimento e problemas, Isto é, o Reino de Deus.


O gênero da superaventura também busca esse ideal, porém, na maioria das vezes, limita-se a restaurar a estrutura do jeito que ela é. De qualquer maneira, Iuri Reblin conclui que teologia e superaventura pretendem estabelecer uma nova realidade através da geração e manifestação de um ideal. Ambas buscam, em essência, um mundo melhor.


Esse texto é um recorte ampliado e atualizado do capítulo "Os elementos religiosos nos quadrinhos de super-heróis" escrito por mim para o livro "Quadrinhos e Cultura Pop: Estudos Interdisciplinares Vol. 2". Você pode acessar o livro aqui .

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