Os arquétipos mitológicos/religiosos dos super-heróis
- Iuri Biagioni Rodrigues

- 24 de jul.
- 5 min de leitura
Atualizado: 25 de jul.
Vamos conhecer os arquétipos propostos por Christopher Knowles no livro Nossos Deuses São Super Heróis!
Por: Iuri Biagioni Rodrigues

No livro Nossos Deuses São Super-Heróis, Knowles considera que todos os super-heróis são, basicamente, salvadores, e propões cinco arquétipos mitológico/religiosos aplicáveis aos super-heróis: o Mago, o Messias, o Golem, a Amazona e a Fraternidade. Vejamos cada um deles.

O Mago é um arquétipo tão antigo quanto a própria ficção. Ele abrange os personagens com poderes místicos, sobrenaturais e associados à magia. Heróis como Doutor Oculto, Senhor Destino, Íbis, o Invencível, John Constantine (anti-herói), Zatanna, Madame Xanadu, Doutor Estranho, Doutor Druida, irmão Vodu, entre outros se enquadram nessa categoria. Knowles (2008) destaca que muitos desses personagens têm seus poderes vinculados a religiões orientais ou africanas, ao misticismo ou ao ocultismo.

Como exemplo, mencionamos o primeiro Senhor Destino, Kent Nelson, que adquire seus poderes místicos em uma viagem à Mesopotâmia, tornando-se o hospedeiro da poderosa entidade Nabu, um Lorde da ordem e poderoso mago conhecido como “o Sábio”. (Nabu é nome de um importante deus da mitologia babilônica). Já o Doutor Estranho viaja até o Himalaia para conhecer o Ancião, seu futuro mestre e responsável por sua iniciação no mundo das artes místicas. Seus poderes são associados a algumas divindades da Mesopotâmia e a entidades fictícias de inspiração ocultista.
O Messias, para Knowles (2008), é o principal arquétipo das histórias em quadrinhos de super-heróis. Representa o herói nobre, honesto, altruísta, sempre disposto a salvar os outros e, se for preciso, dar a sua vida no processo. A crença no Messias é um elemento central do judaísmo, onde se espera um descendente do rei Davi que viria para libertar o povo do cativeiro e restaurar o governo judeu na Palestina. No entanto, ao ouvir a palavra Messias, a maioria das pessoas imediatamente associa a figura de Jesus Cristo. Logo, as raízes desse arquétipo estão na tradição judaico-cristã.
Segundo Knowles (2008, p.139), “o super-herói messiânico torna-se muito popular porque lida com ansiedades profundamente arraigadas na vida americana”. As consequências da crise de 1929, o avanço do Nazifascismo, a corrupção empresarial, o crime organizado e Segunda Guerra Mundial são alguns desses fatores que contribuíram para o surgimento desse arquétipo na Era de Ouro dos quadrinhos estadunidenses.
Entre os super-heróis que representam o arquétipo messiânico estão Superman, Capitão Marvel (Shazam), Gavião Negro, Flash, Caçador de Marte, Thor, Homem-Aranha, Capitão América (um messias patriótico), Adam Warlock e Surfista Prateado. Dentre eles, o Superman merece destaque por ser o primeiro e o mais representativo.

O arquétipo do Golem, de acordo com Knowles (2008), é o segundo mais importante entre os encontrados nos heróis e tem origem na Cabala, o misticismo judaico. O Golem seria uma criatura de origem inanimada, criada por rabinos por meio de encantamentos, com a finalidade de proteger o povo judeu de seus perseguidores.
No caso dos quadrinhos de super-heróis, os personagens que se encaixam nesse arquétipo são anti-heróis ou heróis movidos por sentimentos de vingança ou raiva, como Batman, Espectro, Retalho, Justiceiro, Demolidor, Cavaleiro da Lua e Wolverine. Além do aspecto vingativo, esse arquétipo abrange também personagens que possuem componentes artificiais em seus corpos, como partes cibernéticas, ou que utilizam disfarces que alterem sua natureza. Também engloba aqueles que precisam proteger fragilidades físicas em seus corpos. Enquadram-se aqui super-heróis como Homem de Ferro, Máquina de Combate, Tornado Vermelho, Homem Robô, Cyborg. Por fim, o Coisa, Hulk, Metamorfo e Frankenstein, personagens com características de monstros, também são incluídos nesta categoria.
Knowles Afirma que: "O arquétipo do Golem é, basicamente, o subproduto da insegurança e do orgulho ferido. Ele proporciona um alívio emocional satisfatório para a raiva reprimida, para a frustração e para a sensação da impotência causada por perseguições e provocações". (Knowles, 2008, p. 166)

O próximo arquétipo é a Amazona, que representa a versão feminina do Messias. A nomenclatura é proveniente das mulheres guerreiras da mitologia grega, mas, no contexto da superaventura, o termo engloba quase todas as personagens femininas e pode ser associado à ideia de empoderamento feminino. Nas HQs, as personagens podem ser guerreiras, ter conexão com a natureza, ser um símbolo de justiça, sábia ou realizar sacrifícios para salvar inocentes. Os exemplos mais conhecidos são: Mulher-Maravilha, Canário Negro, Mulher-Gavião, Supergirl, Poderosa, Jean Grey, Feiticeira Escarlate, Vespa, Tempestade, Miss Marvel, Lince Negra, Capitã Marvel e Mulher Invisível. Entre as personagens menos populares temos: Troia, Estelar, Valquiria, Moça-Maravilha, Ártemis, Mulher-Aranha, entre outras.

Por fim, a Fraternidade é o arquétipo das superequipes. Para Knowles, As equipes de heróis, embora tenham surgido como uma estratégia comercial para vender mais revistas, possuem, para o autor, raízes simbólicas profundas na mitologia antiga, principalmente nas tradições egípcia e a greco-romana. Ele também aponta paralelos com os doze apóstolos de Jesus, os doze discípulos de Buda, a lenda de Rei Arthur e os Cavaleiros da Távola Redonda e os Cavaleiros Templários, todos considerados como raízes e/ou influências das superequipes.
Na interpretação de Knowles, as equipes fazem muito sucesso porque são reconfortantes para os fãs que, muitas vezes, se sentem sozinhos ou marginalizados. Nas HQs de equipes, os personagens agem como fãs em interação social. Essas histórias transmitem uma sensação de força e poder por meio da união e da solidariedade. Entre as equipes mais populares estão: a Sociedade da Justiça da América, a Liga da Justiça da América, os Novos Titãs, o Quarteto Fantástico, os X-Men, os Vingadores e Guardiões da Galáxia. Entre as equipes menos conhecidas, temos a Legião dos Super-Heróis, a Patrulha do Destino, os Defensores, os Iluminati e a A-Force por exemplo.

O estudo de tais arquétipos nos permite compreender como as histórias em quadrinhos de super-heróis dialogam com antigas tradições culturais e espirituais, mantendo-se relevantes como mitologias contemporâneas.
Obs: Os arquétipos não são categorias fixas ou engessadas. Por exemplo, Elektra e Mulher-Hulk podem ser encaixadas no arquétipo Golem e no arquétipo Amazona. Já a Feiticeira Escarlate, enquadra-se como amazona e entre os magos.







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